O Discípulo

     Um recém convertido ao Evangelho causou um grande reboliço no templo que passara a freqüentar, diante de um estranho problema que demonstrava possuir: não conseguia fechar os dois olhos, ao mesmo tempo, enquanto orava.
     Informado da situação, o principal dirigente da casa religiosa dispôs-se a investigar o caso, objetivando auxiliar aquele novo freqüentador a superar a dificuldade. Entendia que o problema prejudicava a concentração, tão necessária nos instantes destinados às orações.
     Na qualidade de bom observador, percebeu que o novo discípulo demonstrava ar de preocupação e medo, enquanto orava. Parecia esforçar-se para fechar os olhos, mas não conseguia. Quando fechava um olho, abria o outro, e assim sucessivamente, num gesto de visível intranqüilidade.
     Buscou conhecer antecipadamente os antecedentes daquele homem. Ficou sabendo que se tratava de pessoa modesta, que levava vida muito atormentada e que, em mais de uma oportunidade, havia sido vítima da maldade dos homens.
     Recém – admitido à causa evangélica,ainda portava comportamento contrário aos ensinos espirituais, sendo comum ouvi-lo se queixar do mundo e dos homens. Interessado e preocupado com o noticiário atinente a crimes, roubos e ações infelizes dos homens, fazia freqüentes comentários do tipo:
- Tem muita gente ruim no mundo;
-Deus é Pai de todos, mas uma coisa é certa: Ele tem um bocado de filhos que não valem nada!
     Cientificado de todos esses lances, o dirigente da instituição esperou surgir uma oportunidade e convidou-o para uma entrevista, em ambiente reservado. A sós, travaram o seguinte diálogo:
--O irmão é portador de algum problema físico?
-Não, nenhum. Gozo de boa saúde.
-Tem algum problema de vista ou algum tique nervoso?
-Também não. Vejo bem e não sou nervoso.
-Tem certeza de que não tem problema com os olhos?
-Sim, tenho certeza. Vejo bem até demais.
-O irmão, no entanto, tem sido visto com dificuldades para fechar os olhos, no instante da prece.
-Não é dificuldade não, é obediência.
-Como assim?
-O  Senhor Jesus não disse: “orai e vigiai”?
-Sim, mas o que isto tem a ver?
-Eu cumpro, até quando rezo. Eu oro ao Senhor com um olho fechado, mas fico com o outro bem aberto... de olho nos homens!
     Acreditar, desconfiando, é caminho certo para se colher a indiferença e a amargura. Desacreditar dos outros é seguir na contramão da lei de amor ao próximo.
     A vida é uma interação entre os homens. A humanidade é imperfeita, porém, fazemos parte dela e, como tal, dependemos dos outros para nosso próprio crescimento.
     Se alguém lhe trai ou machuca, tenha certeza de uma coisa: o problema  maior é desse alguém e não seu. Afinal, perante a inexorável Lei do Retorno, é melhor a condição de vítima do que a de réu.
     Quem trai a confiança alheia torna-se, inapelavelmente, vítima de suas próprias ações. Há dores que só quem as sofre sabe-lhes qual é a verdadeira causa.
     Assim como queremos obter a confiança dos outros, devemos de nossa parte confiar neles, apesar das imperfeições que todos ainda possuímos.
     Acerca dos outros, não se deixe levar pela primeira impressão, principalmente se ela for negativa. Todos merecem uma nova chance, inclusive você.
     “O meu mandamento é este: que vos ameis uns aos outros, como eu vos amei” (João 15 – 12).